a partir de As mãos naufragadas, de Beatriz Hierro Lopes
Vendia peixe na rua. Gelados quando havia tempo para os fazer. Vendia frescura para um Inverno que se imaginava quente. Raquel, à espera do autocarro, ouvia-a: dizia, que gostava de esperar, e que a espera a resguardava do sol, protegendo os gelados e os peixes do sol. Tinha um nome e um sorriso, a mulher que todos os dias esperava. Vestida de branco, a pele e os olhos claros fundiam-se na sombra. Sem se saber onde ela terminava e a sua diversão começava.
Vendo chegar o autocarro, levava a mão à cara, para a limpar, em busca de fresco. O calor fazia-a sentir o corpo pesado. A alma pesada, dizia, ao abrir as palavras: “No mar há várias belezas… Há rochas, pescadores, barcos, sereias, tubarões, baleias, peixes, algumas gaivotas, estrelas-do-mar, entre outros… Mas também há lixo.” A filha mais velha (que não trabalhava) fazia anos daí a dois dias. Queria uma estrela-do-mar. Uma estrela-do-mar amarela, que corre nas águas frias do mar. Mas naquele Verão ninguém ficava em casa; alguns preferiam ir para a areia fina da praia ou ver os corais que ficam nas superfícies da Afurada.
Sentada no autocarro, num banco quente - contava histórias de meninices antigas – em que os meninos brincavam à beira da nascente, ali perto. A casa onde vivia seria vendida: haveria sempre estrelas para dar à filha. O marido que morrera de imprevisto, nunca era tocado. Também ele tivera nome mas, pela boca da viúva, era tão-somente conhecido como o morto. O seu morto. Aquele que enterrara no quintal da sua casa, junto ao lindo limoeiro.
Custava-lhe vender a casa: dizia-o, com pesar. Até os mortos se vendem.
Nádia Monteiro, nº13, 7ºA
Vendia quadros de sereias, baleias, nascentes, estrelas-do-mar, corais, barcos e algas. Nessa rua onde vendia, à minha beira, havia um caixote do lixo, muitas rochas e areia. Esse sítio onde vendia, não era de agrado.
Catarina, à espera do autocarro, ouvia-a: dizia que gostava de esperar, que a espera a resguardava da chuva, protegendo os seus quadros por vender. Vestida de branco, o seu casaco tinha desenhos de peixes, gaivotas e de água; a pele e os olhos claros fundiam-se na sombra. Sem se saber onde ela terminava e a sua viuvez começava.
Vendo chegar o autocarro, levava aos bolsos as mãos naufragadas, em busca de consolo. Vazios, faziam-na sentir o corpo pesado. A alma pesada, como um tubarão, dizia, ao abrir as palavras para que delas saíssem luz. A filha mais velha, que não vendia quadros, faria anos daí a dois dias. Queria uma viola. Queria uma viola azul para cantar à noite, na Afurada. Mas naquele Inverno, ninguém parava na rua para comprar calor à viúva.
Sentada no autocarro, num banco frio, contava histórias sobre pescadores e meninas antigos, embalando com o olhar, uma tristeza doce. A casa onde vivia seria vendida: haveria sempre violas para dar às filhas. O marido, morrera de imprevisto, nunca era tocado. Também ele tivera nome, mas pela boca da viúva, era tão-somente conhecido como o morto. O seu morto. Aquele que enterrara no quintal de sua casa, junto ao limoeiro.
Custava-lhe vender a casa; dizia-o com pesar. Até os mortos se vendem.
Ricardo, nº15, 7º B
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